terça-feira, 24 de julho de 2012

Síndrome da Alienação Parental

Introdução

"Quem motiva uma boa ação,
É tão meritório como aquele que a praticou”
Talmude

Mudam-se os tempos e mudam-se as vontades, diz o ditado popular, e uso esta frase dos ditos portugueses para prefaciar este trabalho académico, feito por alunos do 2º ano de Serviço Social do Pós Laboral, do ISCSP/UTL, para a cadeira de Gestão e Mediação de Conflitos ministrada pela Professora Doutora Dália Costa.
A pertinência do ditado face ao que este trabalho aborda é imensa, devido ao facto de hoje em dia ser cada vez mais comum as separações e os divórcios, acompanhadas claro pela consequente necessidade de regulação do poder parental, e dos cuidados que as crianças requerem, atendendo sempre às necessidades das crianças e evitando consequências maiores para as mesmas.
A SAP é a sigla que designa a Síndrome da Alienação Parental, que na sua conceptualização é entendida como uma forma de maus-tratos, quando um dos progenitores tenta forçosamente afastar a criança do contacto com o outro progenitor, segundo o autor Richard A. Gardner,[1] o que faz com que a criança possa sofrer alguns transtornos advindos dessa Alienação Parental.
Este é sem sombra de duvida, um tema de suma importância para os futuros assistentes sociais, cujo objetivo é encontrar caminhos que levem a melhores soluções para o sistema cliente, mas também de criar mecanismos e vias de diálogo a famílias em conflito e ou situação de separação.
É de suma importância para o assistente social, cuja formação de carácter humanista é fundamentalmente voltada para a pessoa humana, na consciencialização dos direitos humanos e do exercício de uma cidadania participativa, levando o assistente social a ser também um agente de diálogo na comunidade, no qual visa o bem de todos os que necessitem da sua ajuda e orientação, sobretudo os que se encontram em situação mais fragilizada como as crianças na situação que é abordada neste trabalho.
O tema é amplamente abordado, mas é necessário dizer que é recente, pois o novo paradigma social do pós-industrialismo, e de uma nova ordem que se baseia num amplo laicismo social e de uma feroz globalização, trouxeram importantes alterações à sociedade como a emancipação da mulher, maior igualdade entre géneros e alterações no modo de vida das famílias, como novas formas de família, aumento de divórcios e de casos de alienação parental.
Em 15 de Abril de 2011, realizou-se na Universidade de Lisboa, o Iº Seminário FDL que abordou o assunto, sob o título “Outros Protagonistas”, com a temática “Condição Jurídica da criança e alienação parental” onde estiveram presentes ilustres juristas vindos de outros países como o Brasil onde a Alienação Parental é considerada maltrato infantil e é considerado crime, no nosso país a Alienação Parental não é reconhecida, o que dificulta o reconhecimento da Síndrome como transtorno mental sofrido pela criança em situação de separação forçada de um dos progenitores, urge pois que se realizem mais eventos destes onde os assistentes sociais e demais agentes possam promover o debate sobre o fenómeno da SAP e os direitos inalienáveis das crianças vitimas deste maltrato infantil.
O Trabalho ora presente, fez-se em dois formatos e duas etapas, num primeiro momento, foi feita o estudo do tema e a apresentação de slides em sala de aula, com debate, numa segunda fase aprofundou-se o tema, que é agora apresentado em formato escrito, respeitando as linhas iniciais do estudo e da apresentação.
Foi um trabalho enriquecedor, na medida em que se trata de abordar a teoria sobre o que é a Alienação Parental, quer em aspectos psicológicos quer legais, estando sobretudo aliada à conceptualização da Mediação de Conflitos, e isso permitiu colocarmo-nos no lugar de pais, mães e filhos em situação idêntica, tendo em atenção que na maioria das vezes as crianças sofrem diversas consequências do divórcio dos pais sem que estes se apercebam da situação e isso é o que se deve evitar com a mediação familiar na busca de uma solução em que todos sejam incluídos com equidade.

1 - Um tema recente na nossa sociedade
"Cada fracasso ensina ao homem
algo que necessitava aprender"
Charles Dickhens
Pretendemos com este trabalho, analisar á luz das teorias que fundamentam a AP Alienação Parental, tema ainda recente em Portugal no que se refere ao seu reconhecimento como crime, e à dificuldade que esse malgrado não reconhecimento da síndrome acarreta em termos sanitários, por não ser considerada um transtorno psíquico sofrido pela criança, sem falar de depressões e outras consequências possíveis, outrossim a “Convenção sobre os Direitos da Criança”[2] adotada pelas Nações Unidas em 2000 e ratificada por Portugal em 2003, aborda também os aspectos sobre legais sobre os direitos da criança no que refere à Responsabilidade Parental.
O objetivo deste trabalho é de uma forma concisa e cabal, responder a importantes perguntas que de forma conceptual ou analítica, às questões e nos permitam desenvolver a capacidade negocial do conflito face a uma situação similar, em que seja promovido o bem-estar da criança e dos progenitores, que assim ficam beneficiados por um acordo entre ambas as partes,  sendo as seguintes questões:
1º O que é a Alienação Parental?
2º Qual o papel da mediação familiar ?
3º O Estudo de caso
4º Conclusão
Como nas palavras de Eduardo Sá, que afirma que “todos os divórcios se dão por mútuo acordo, no entanto na procura de horizontes de felicidade os pais sem querer magoam os filhos”[3] e estes menores (até os 18 anos) devem ter os seus interesses respeitados, afirmou ainda ao prefaciar o livro de José Manuel Aguilar, que trata deste assunto.
Outrossim, a imprensa escrita também nos dá bastante informação e provas de ser este um fenómeno crescente na sociedade portuguesa, como a reportagem editada no jornal “Público” de 22 de Abril de 2012 na página 14 [4], com o título “Conflitos - Que é feito dos filhos que sobram da guerra entre os homens e as mulheres?”

2 – Alienação Parental
“Sábio é o Pai que conhece o seu próprio filho.”
William Shakespeare
“A Alienação Parental é um conjunto de comportamentos seriados praticados pelo progenitor (guardião), com o objetivo de criar uma relação de carácter exclusivo entre ele e a(s) criança(s) de forma a excluir para sempre o outro progenitor da vida dos seus filhos.” [Instituto Português de mediação familiar]
Construindo uma imagem negativa do pai ou da mãe, esta síndrome leva ao afastamento e à quebra de uma relação familiar. Uma criança alienada assume-se como detentora da decisão de não querer estar com o outro progenitor.
A origem desta síndrome está ligada ao divórcio, o processo seguinte é a disputa pela guarda dos filhos. Um progenitor fica com a responsabilidade parental da criança e o outro fica somente com o direito a visitas em dias determinados, normalmente em fins-de-semana alternados. Os encontros que são impostos acabam por não ser suficientes para estabelecer um laço familiar e acaba por ocorrer um distanciamento e a afetividade diminui. O conceito de família nesta situação é muito importante, definindo-se a “família como um conjunto invisível de exigências funcionais que organiza a interação dos membros da mesma, considerando-a igualmente como um sistema que opera através de padrões transacionais”. (conceito de família, blog.clickgratis – assistência social e questões sociais, 2011). Assim, no interior da família os indivíduos podem constituir a sua maneira de ser que é relacionada pela geraçãosexo, interesse e/ ou função havendo diferentes níveis de poder e onde os comportamentos de um membro afetam e influenciam os outros membros.
A família como unidade social enfrenta uma série de tarefas de desenvolvimento diferindo a nível dos parâmetros culturais mas possuindo as mesmas raízes universais (MINUCHIN,1990).
O conceito de família define o comportamento das pessoas, a sua evolução. Atualmente a estrutura familiar levou à valorização da filiação afetiva, segundo Oliveira (2002,p.233), “a afetividade traduzida no respeito de cada um por si e por todos os membros – a fim de que a família seja respeitada em sua dignidade e honoralidade perante o corpo social é uma das características da família atual”. Daí entendermos que o estado de família influencia os laços afetivos como os desentendimentos que possam surgir. A família deve-se basear no respeito, no cuidado, amizade, afinidade, atenção e na cooperação com todos os membros.
Quando existe uma rutura conjugal, gera-se no parente alienado um sentimento de rejeição e/ou traição surgindo assim uma tendência vingativa. As pessoas não conseguem encarar o processo de separação pois têm interesse em preservar a convivência com o filho para “se vingar” do cônjuge. A este processo o psiquiatra americano Richard Gardner denominou este fenómeno de “síndrome de alienação parental”: manipulação sentimental da criança para que odeie o genitor sem qualquer justificação. O filho é utilizado como um instrumento direto.
De acordo com Richard Gardner o Síndrome da Alienação Parental é composto por dois fatores: a manipulação sentimental (lavagem cerebral) da criança por um dos progenitores com o objetivo de denegrir o outro e o segundo fator são as contribuições da própria criança em apoio ao progenitor alienante na campanha contra o progenitor alienado é como se representa uma balança, os pais pressionam a criança para o seu lado. Representa quase uma relação exclusiva da criança com um dos progenitores.
As crianças que se encontram num processo de rutura familiar estão mais vulneráveis às ocorrências do dia-a-dia e em casos mais graves como abusos ou situações de violência por parte dos progenitores que podem originar efeitos devastadores no equilíbrio emocional pois esta é manipulada pelos progenitores. Segundo o Instituto Português de Mediação Familiar as consequências por parte da criança podem ser várias, desde a depressão crónica, incapacidade de adaptação a ambientes psicossociais normais, transtornos de identidade e de imagem, sentimento incontrolável de culpa, isolamento, desespero, insucesso escolar, falta de organização, gravidez precoce, comportamento antissocial, dupla personalidade, até suicídio em casos extremos, as características percetíveis deste processo nomeadamente da alienação parental são: o processo destrutivo da imagem de um dos progenitores, o afastamento forçado, físico e psicológico das crianças em relação ao progenitor alienado.
O processo de divórcio vai desde a decisão unilateral e litigiosa, a acusações e insinuações de um progenitor ao outro, desenvolvendo-se assim a síndrome em causa.
Um divórcio é sempre uma fase dolorosa para os filhos, mesmo quando acaba por ser a melhor solução para toda a família. A separação de um casal é sempre um processo complicado que gera alterações para todos, onde está em causa a destruição da sua imagem. Representa não só o conflito entre os pais e os filhos mas também pode representar um conflito entre irmãos.
Quando se pretende a “suspensão da convivência conjugal” ocorrem desequilíbrios e originam roturas no seio de um casal. Contudo se o casal não consegue manter uma relação conjugal o melhor para todos seria manter uma relação parental.
“Em Portugal, o divórcio poderá ser alcançado através da via litigiosa ou por mútuo consentimento. O divórcio litigioso é requerido, no tribunal, por um dos cônjuges contra o outro, e baseia-se no princípio de que existiu uma violação dos direitos e deveres conjugais, comprometendo desta forma a possibilidade da vida em comum. Por outro lado, o divórcio por mútuo consentimento pressupõem o cessar da convivência conjugal, por vontade de um ou de ambos os cônjuges sem que seja necessária a intervenção da autoridade judicial.” (divorcio.tuga.pt)
Assim o mútuo consentimento pode cessar a convivência conjugal mas ao mesmo tempo pode permitir que haja uma relação parental, que se define como um processo de interação com os pais que promove estabilidade aos filhos ao nível sentimental, conjugal e social.
A alienação Parental está relacionada com a necessidade do poder parental no sentido em que hoje em dia é cada vez mais comum as separações e os divórcios, é em suma o afastamento do filho de um dos progenitores provocado pelo outro.
Estamos numa era onde as funções sociais desempenhadas por homens e mulheres são diferentes de há uns tempos atrás onde a mulher assumia o papel de doméstica e o homem tinha as responsabilidades laborais e financeiras. Actualmente a evolução fez-se parecer na saída da mulher dentro da casa, levando-a a estudar, isto é, a ter projecção de carreira. Por outro lado o homem passou a estar mais participativo nas tarefas da casa, tornando-se um pai mais próximo capaz de cuidar da casa e dos filhos, construindo uma relação de afeto com a família.
Assim concluímos que os homens passaram a ter mais poder na guarda dos filhos caso ocorra um divórcio.
Segundo a Rede Judiciária Europeia em Matéria Civil e comercial, "Nas situações de divórcio ou separação, as responsabilidades parentais, são definidas por acordo  ou por sentença judicial".
A consagração do princípio da responsabilidade parental é a expressão de um poder paternal, que não se limita a assumir a guarda ou a suprir a incapacidade, mas que se concretiza também na adoção de deveres.
A responsabilidade parental configura uma situação jurídica complexa na qual compete aos pais, no interesse dos filhos, até à maioridade (18 anos) ou emancipação destes, velar pela segurança e saúde destes, prover ao seu sustento, dirigir a sua educação, representá-los, ainda que nascituros, e administrar os seus bens.”
Os filhos devem obediência aos pais; estes, porém, de acordo com a maturidade dos filhos, devem ter em conta a sua opinião nos assuntos familiares importantes e reconhecer-lhes autonomia na organização da própria vida”
Ao ser entregue ao progenitor a guarda dos filhos, fomenta no caso da alienação parental o conflito com o Progenitor que não tem a guarda do mesmo, criando uma “guerra” inclusivamente para as crianças que são também prejudicadas. A criança deixa de ser percebida como um ser de emoções e sentimentos para ser tratada como um objecto de satisfação dos desejos dos pais.
Para concluir, Gardner afirma que o progenitor alienado deve ser orientado a não utilizar o filho em provocações ofensivas ao alienador e não insistir em saber dele se determinada situação é verdadeira ou falsa. Ele deve aprender que a melhor forma para as falsas insinuações é uma vivência real e sábia e que uma relação baseada em amor verdadeiro é mais sólida que uma relação baseada no medo. Deve procurar, assim, criar um ambiente oposto ao oferecido pelo alienador, no qual o filho possa manifestar todas as suas impressões e sensações, quer sejam positivas ou negativas, com relação a ambos os progenitores.
Não menos importante a orientação é feita e iremos falar mais à frente, através de um mediador familiar que tem como papel fundamental controlar, nesta fase de instabilidade da vida da família, a gestão do conflito.
A mediação tem lugar antes do processo judiciário e na fase judicial propriamente dita (Instituto Português de mediação familiar).[5]


[1] GARDENER, R. A, - (2001) “"Parental Alienation Syndrome (PAS): Sixteen Years Later". Academy Forum
[2] UNICEF (2000), “A Convenção sobre os Direitos da Criança” http://www.unicef.pt/docs/pdf_publicacoes/convencao_direitos_crianca2004.pdf
[3] SÁ, Eduardo (2008), “Prefácio no livro “Síndrome de Alienação Parental – Filhos manipulados por um cônjuge para odiar outro de Aguilar, José Manuel; Caleidoscópio, Lisboa.
[4] RIBEIRO, Graça Barbosa (2012), “Conflitos - Que é feito dos filhos que sobram da guerra entre os homens e as mulheres?”; Público, dom, 22/04/2012, pp 14 http://www.publico.pt/Sociedade/que-e-feito-dos-filhos-que-sobram-da-guerra-entre-os-homens-e-as-mulheres-1543084

Autor Filipe de Freitas Leal

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Sobre o Autor

Filipe de Freitas Leal nasceu em Lisboa, em 1964, estudou Serviço Social pelo Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade de Lisboa. Estagiou como Técnico de Intervenção Social numa Instituição vocacionada à reinserção social de ex-reclusos e apoio a famílias em vulnerabilidade social, é blogger desde 2007, de cariz humanista, também dedica-se a outros blogs de temas diversos.

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