"Quem motiva uma boa ação,
É tão meritório como aquele que a
praticou”
Talmude
Mudam-se
os tempos e mudam-se as vontades, diz o ditado popular, e uso esta frase dos
ditos portugueses para prefaciar este trabalho académico, feito por alunos do
2º ano de Serviço Social do Pós Laboral, do ISCSP/UTL, para a cadeira de Gestão
e Mediação de Conflitos ministrada pela Professora Doutora Dália Costa.
A
pertinência do ditado face ao que este trabalho aborda é imensa, devido ao
facto de hoje em dia ser cada vez mais comum as separações e os divórcios,
acompanhadas claro pela consequente necessidade de regulação do poder parental,
e dos cuidados que as crianças requerem, atendendo sempre às necessidades das
crianças e evitando consequências maiores para as mesmas.
A SAP é
a sigla que designa a Síndrome da Alienação Parental, que na sua conceptualização
é entendida como uma forma de maus-tratos, quando um dos progenitores tenta
forçosamente afastar a criança do contacto com o outro progenitor, segundo o
autor Richard A. Gardner,[1] o que faz com que a
criança possa sofrer alguns transtornos advindos dessa Alienação Parental.
Este é sem sombra de duvida, um tema de suma importância para os futuros
assistentes sociais, cujo objetivo é encontrar caminhos que levem a melhores
soluções para o sistema cliente, mas também de criar mecanismos e vias de diálogo
a famílias em conflito e ou situação de separação.
É de suma importância para o assistente social, cuja formação de carácter
humanista é fundamentalmente voltada para a pessoa humana, na
consciencialização dos direitos humanos e do exercício de uma cidadania
participativa, levando o assistente social a ser também um agente de diálogo na
comunidade, no qual visa o bem de todos os que necessitem da sua ajuda e
orientação, sobretudo os que se encontram em situação mais fragilizada como as
crianças na situação que é abordada neste trabalho.
O tema é amplamente abordado, mas é necessário dizer que é recente, pois o
novo paradigma social do pós-industrialismo, e de uma nova ordem que se baseia
num amplo laicismo social e de uma feroz globalização, trouxeram importantes
alterações à sociedade como a emancipação da mulher, maior igualdade entre
géneros e alterações no modo de vida das famílias, como novas formas de
família, aumento de divórcios e de casos de alienação parental.
Em 15 de Abril de 2011, realizou-se na Universidade de Lisboa, o Iº
Seminário FDL que abordou o assunto, sob o título “Outros Protagonistas”,
com a temática “Condição Jurídica da criança e alienação parental” onde
estiveram presentes ilustres juristas vindos de outros países como o Brasil onde
a Alienação Parental é considerada maltrato infantil e é considerado crime, no
nosso país a Alienação Parental não é reconhecida, o que dificulta o
reconhecimento da Síndrome como transtorno mental sofrido pela criança em
situação de separação forçada de um dos progenitores, urge pois que se realizem
mais eventos destes onde os assistentes sociais e demais agentes possam
promover o debate sobre o fenómeno da SAP e os direitos inalienáveis das
crianças vitimas deste maltrato infantil.
O Trabalho ora presente, fez-se em dois formatos e duas etapas, num
primeiro momento, foi feita o estudo do tema e a apresentação de slides em sala
de aula, com debate, numa segunda fase aprofundou-se o tema, que é agora
apresentado em formato escrito, respeitando as linhas iniciais do estudo e da
apresentação.
Foi
um trabalho enriquecedor, na medida em que se trata de abordar a teoria sobre o
que é a Alienação Parental, quer em aspectos psicológicos quer legais, estando
sobretudo aliada à conceptualização da Mediação de Conflitos, e isso permitiu
colocarmo-nos no lugar de pais, mães e filhos em situação idêntica, tendo em
atenção que na maioria das vezes as crianças sofrem diversas consequências do
divórcio dos pais sem que estes se apercebam da situação e isso é o que se deve
evitar com a mediação familiar na busca de uma solução em que todos sejam
incluídos com equidade.
1 - Um tema recente na nossa sociedade
"Cada fracasso ensina ao homem
algo que necessitava aprender"
Charles Dickhens
Pretendemos
com este trabalho, analisar á luz das teorias que fundamentam a AP Alienação
Parental, tema ainda recente em Portugal no que se refere ao seu reconhecimento
como crime, e à dificuldade que esse malgrado não reconhecimento da síndrome
acarreta em termos sanitários, por não ser considerada um transtorno psíquico
sofrido pela criança, sem falar de depressões e outras consequências
possíveis, outrossim a “Convenção sobre os Direitos da Criança”[2] adotada pelas Nações Unidas em 2000
e ratificada por Portugal em 2003, aborda também os aspectos sobre legais sobre
os direitos da criança no que refere à Responsabilidade Parental.
O
objetivo deste trabalho é de uma forma concisa e cabal, responder a importantes
perguntas que de forma conceptual ou analítica, às questões e nos permitam
desenvolver a capacidade negocial do conflito face a uma situação similar, em
que seja promovido o bem-estar da criança e dos progenitores, que assim ficam
beneficiados por um acordo entre ambas as partes, sendo as seguintes
questões:
1º O que
é a Alienação Parental?
2º Qual
o papel da mediação familiar ?
3º O
Estudo de caso
4º
Conclusão
Como nas
palavras de Eduardo Sá, que afirma que “todos os divórcios se dão por
mútuo acordo, no entanto na procura de horizontes de felicidade os pais sem
querer magoam os filhos”[3] e estes menores (até os 18 anos)
devem ter os seus interesses respeitados, afirmou ainda ao prefaciar o livro
de José Manuel Aguilar, que trata deste assunto.
Outrossim,
a imprensa escrita também nos dá bastante informação e provas de ser este um
fenómeno crescente na sociedade portuguesa, como a reportagem editada no jornal
“Público” de 22 de Abril de 2012 na página 14 [4],
com o título “Conflitos - Que é feito dos filhos que sobram da
guerra entre os homens e as mulheres?”
2 – Alienação Parental
“Sábio é o Pai que conhece o seu próprio filho.”
William Shakespeare
“A
Alienação Parental é um conjunto de comportamentos seriados praticados pelo
progenitor (guardião), com o objetivo de criar uma relação de carácter
exclusivo entre ele e a(s) criança(s) de forma a excluir para sempre o outro
progenitor da vida dos seus filhos.” [Instituto Português de mediação familiar]
Construindo
uma imagem negativa do pai ou da mãe, esta síndrome leva ao afastamento e à
quebra de uma relação familiar. Uma criança alienada assume-se como detentora
da decisão de não querer estar com o outro progenitor.
A
origem desta síndrome está ligada ao divórcio, o processo seguinte é a disputa
pela guarda dos filhos. Um progenitor fica com a responsabilidade parental da
criança e o outro fica somente com o direito a visitas em dias determinados,
normalmente em fins-de-semana alternados. Os encontros que são impostos acabam
por não ser suficientes para estabelecer um laço familiar e acaba por ocorrer
um distanciamento e a afetividade diminui. O conceito de família nesta situação
é muito importante, definindo-se a “família
como um conjunto invisível de exigências funcionais que organiza a interação
dos membros da mesma, considerando-a igualmente como um sistema que opera
através de padrões transacionais”. (conceito de família, blog.clickgratis
– assistência social e questões sociais, 2011). Assim, no interior da
família os indivíduos podem constituir a sua maneira de ser que é relacionada
pela geração, sexo, interesse e/ ou função havendo diferentes níveis de
poder e onde os comportamentos de um membro afetam e influenciam os outros
membros.
A família como unidade social enfrenta uma série de tarefas de
desenvolvimento diferindo a nível dos parâmetros culturais mas
possuindo as mesmas raízes universais (MINUCHIN,1990).
O conceito de família define o comportamento das pessoas, a sua evolução.
Atualmente a estrutura familiar levou à valorização da filiação afetiva,
segundo Oliveira (2002,p.233), “a afetividade traduzida no respeito de
cada um por si e por todos os membros – a fim de que a família seja respeitada
em sua dignidade e honoralidade perante o corpo social é uma das
características da família atual”. Daí entendermos que o estado de família
influencia os laços afetivos como os desentendimentos que possam surgir. A família
deve-se basear no respeito, no cuidado, amizade, afinidade, atenção e na
cooperação com todos os membros.
Quando existe uma rutura conjugal, gera-se no parente alienado um
sentimento de rejeição e/ou traição surgindo assim uma tendência vingativa. As
pessoas não conseguem encarar o processo de separação pois têm interesse em
preservar a convivência com o filho para “se vingar” do cônjuge. A este
processo o psiquiatra americano Richard Gardner denominou este
fenómeno de “síndrome de alienação parental”: manipulação sentimental da
criança para que odeie o genitor sem qualquer justificação. O filho é utilizado
como um instrumento direto.
De acordo com Richard Gardner o Síndrome da Alienação Parental é composto
por dois fatores: a manipulação sentimental (lavagem cerebral) da criança por
um dos progenitores com o objetivo de denegrir o outro e o segundo fator são as
contribuições da própria criança em apoio ao progenitor alienante na campanha
contra o progenitor alienado é como se representa uma balança, os pais
pressionam a criança para o seu lado. Representa quase uma relação exclusiva da
criança com um dos progenitores.
As crianças que se encontram num processo de rutura familiar estão mais
vulneráveis às ocorrências do dia-a-dia e em casos mais graves como abusos ou
situações de violência por parte dos progenitores que podem originar efeitos
devastadores no equilíbrio emocional pois esta é manipulada pelos progenitores.
Segundo o Instituto Português de Mediação Familiar as consequências por parte
da criança podem ser várias, desde a depressão crónica, incapacidade de
adaptação a ambientes psicossociais normais, transtornos de identidade e de
imagem, sentimento incontrolável de culpa, isolamento, desespero, insucesso
escolar, falta de organização, gravidez precoce, comportamento antissocial,
dupla personalidade, até suicídio em casos extremos, as características
percetíveis deste processo nomeadamente da alienação parental são: o processo
destrutivo da imagem de um dos progenitores, o afastamento forçado, físico e
psicológico das crianças em relação ao progenitor alienado.
O processo de divórcio vai desde a decisão unilateral e litigiosa, a
acusações e insinuações de um progenitor ao outro, desenvolvendo-se assim a
síndrome em causa.
Um divórcio é sempre uma fase dolorosa para os filhos, mesmo quando acaba
por ser a melhor solução para toda a família. A separação de um casal é sempre
um processo complicado que gera alterações para todos, onde está em causa a
destruição da sua imagem. Representa não só o conflito entre os pais e os
filhos mas também pode representar um conflito entre irmãos.
Quando se pretende a “suspensão da convivência conjugal” ocorrem
desequilíbrios e originam roturas no seio de um casal. Contudo se o casal não
consegue manter uma relação conjugal o melhor para todos seria manter uma
relação parental.
“Em Portugal, o divórcio poderá ser alcançado através da
via litigiosa ou por mútuo consentimento. O divórcio litigioso é requerido, no
tribunal, por um dos cônjuges contra o
outro, e baseia-se no princípio de que existiu uma violação dos direitos e
deveres conjugais, comprometendo desta forma a possibilidade da vida em
comum. Por outro lado, o divórcio por mútuo
consentimento pressupõem o cessar da convivência conjugal, por vontade de um ou
de ambos os cônjuges sem que seja necessária a intervenção da autoridade
judicial.” (divorcio.tuga.pt)
Assim o mútuo consentimento pode cessar a convivência conjugal mas ao mesmo
tempo pode permitir que haja uma relação parental, que se define como um processo
de interação com os pais que promove estabilidade aos filhos ao nível
sentimental, conjugal e social.
A alienação Parental está relacionada com a necessidade do poder parental
no sentido em que hoje em dia é cada vez mais comum as separações e os divórcios,
é em suma o afastamento do filho de um dos progenitores provocado pelo outro.
Estamos numa era onde as funções sociais desempenhadas por homens e
mulheres são diferentes de há uns tempos atrás onde a mulher assumia o papel de
doméstica e o homem tinha as responsabilidades laborais e financeiras.
Actualmente a evolução fez-se parecer na saída da mulher dentro da casa,
levando-a a estudar, isto é, a ter projecção de carreira. Por outro lado o
homem passou a estar mais participativo nas tarefas da casa, tornando-se um pai
mais próximo capaz de cuidar da casa e dos filhos, construindo uma relação de
afeto com a família.
Assim concluímos que os homens passaram a ter mais poder na guarda dos
filhos caso ocorra um divórcio.
Segundo a Rede Judiciária Europeia em
Matéria Civil e comercial, "Nas situações de divórcio ou separação, as
responsabilidades parentais, são definidas por acordo ou por sentença
judicial".
“A consagração do princípio da responsabilidade parental é
a expressão de um poder paternal, que não se limita a assumir a guarda ou a
suprir a incapacidade, mas que se concretiza também na adoção de deveres.
“A responsabilidade parental configura uma situação
jurídica complexa na qual compete aos pais, no interesse dos filhos, até à
maioridade (18 anos) ou emancipação destes, velar pela segurança e saúde
destes, prover ao seu sustento, dirigir a sua educação, representá-los, ainda
que nascituros, e administrar os seus bens.”
“Os filhos devem obediência aos pais; estes, porém, de
acordo com a maturidade dos filhos, devem ter em conta a sua opinião nos
assuntos familiares importantes e reconhecer-lhes autonomia na organização da
própria vida”
Ao ser
entregue ao progenitor a guarda dos filhos, fomenta no caso da alienação
parental o conflito com o Progenitor que não tem a guarda do mesmo, criando uma
“guerra” inclusivamente para as crianças que são também prejudicadas. A criança
deixa de ser percebida como um ser de emoções e sentimentos para ser tratada
como um objecto de satisfação dos desejos dos pais.
Para
concluir, Gardner afirma que o progenitor alienado deve ser orientado a não
utilizar o filho em provocações ofensivas ao alienador e não insistir em saber
dele se determinada situação é verdadeira ou falsa. Ele deve aprender que a
melhor forma para as falsas insinuações é uma vivência real e sábia e que uma
relação baseada em amor verdadeiro é mais sólida que uma relação baseada no
medo. Deve procurar, assim, criar um ambiente oposto ao oferecido pelo
alienador, no qual o filho possa manifestar todas as suas impressões e
sensações, quer sejam positivas ou negativas, com relação a ambos os
progenitores.
Não menos importante a orientação é feita e iremos falar mais à frente, através
de um mediador familiar que tem como papel fundamental controlar, nesta fase de
instabilidade da vida da família, a gestão do conflito.
A mediação tem lugar antes do processo judiciário e na fase judicial
propriamente dita (Instituto Português de mediação familiar).[5]
[1] GARDENER, R. A, - (2001) “"Parental Alienation Syndrome (PAS): Sixteen
Years Later". Academy Forum
[3] SÁ, Eduardo (2008), “Prefácio
no livro “Síndrome de Alienação Parental – Filhos manipulados por um cônjuge
para odiar outro de Aguilar, José Manuel”;
Caleidoscópio, Lisboa.