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terça-feira, 24 de julho de 2012

O Plano Nacional de Saúde para Pessoas Idosas

As mudanças que têm vindo a ocorrer no mundo, têm tido um impacto derradeiro, no que toca à estrutura demográfica, sobretudo nos países do velho continente, ao qual Portugal não está isento, como aliás é um dos países em que o envelhecimento demográfico, tem sido mais acentuado e com consequências bastante preocupantes, sobretudo no que toca à sustentabilidade do sistema de pensões, reformas e segurança social, tendo em conta que o envelhecimento demográfico, que este trabalho aborda, acontece no topo em que a esperança de vida à nascença, tem vindo a aumentar, atingindo hoje para os homens os 76,4 anos e para as mulheres os 82,3 fazendo uma média de 79,5 anos,[1] mas esse envelhecimento é agravado na base, com uma natalidade a reduzir, os portugueses têm hoje, cada vez menos filhos, atualmente o índice sintético de fertilidade em Portugal é de cerca de 1,3 filhos por mulher[2].

1 - Introdução
"Quem motiva uma boa ação,
É tão meritório como quem a pratica”
Talmude

O envelhecimento na estrutura demográfica portuguesa, não fica só pelo índice de natalidade e esperança de vida, mas influi diretamente no que é a parcela da população ativa que contribui para as reformas e outros apoios sociais, mas também de forma indireta influi até nos hábitos de consumo e na produtividade da economia portuguesa, visto haver indícios que a população está a diminuir e respectivamente a população em idade ativa devido ao envelhecimento demográfico que atingiu o nível 5.
Todas estas alterações influem, não só na maneira como passamos a ver a população idosa, mas também paulatinamente e de forma clara, constrói-se uma nova imagem do idoso num contexto de integração intergeracional, que é alias o tema do Ano Europeu para o Envelhecimento Ativo e da solidariedade entre gerações, é pertinente no que toca à discussão desta realidade social bem como da promoção do diálogo intergeracional criador de uma nova cultura e atitude de integração.
Mas o que se passa com o envelhecimento populacional, não faz só mudar a opinião pública sobre a população idosa, mas também e devido às consequências sócio-económicas, faz com que se tenham de aplicar políticas públicas para o apoio à terceira idade, mas também políticas pública que possam prever e promover o crescimento populacional, com o intuito de sanar este e outros problemas que afetam a população idosa no país, que é já uma importante fatia do mercado interno de consumo e um dos setores económicos que mais cresce.
Segundo previsões das Nações Unidas, até 2050, haverá um aumento considerável de pessoas de 65 anos e mais anos, como diz o artigo “O Futuro é Grisalho[3], afirmando que o futuro será grisalho ou melhor dizendo será idoso.
Portanto o problema do envelhecimento é acima de tudo um problema social que merece a maior atenção, pois também é um problema económico e um problema político, requerendo a maior atenção das autoridades com políticas adequadas,[4] sendo que hoje a idade da velhice e a idade da reforma deixaram de ser coincidentes.
Uma das consequências sociais do envelhecimento a par do desenvolvimento tecnológico é que no futuro haverá falta de trabalho para uma grande parcela da sociedade, os sistemas sociais de solidariedade fragilizam-se e a civilização que até aqui existiu, do “Estado Providência”, acabou, urge pois que um novo modelo surja baseado num novo paradigma, e passa obviamente pela aplicação justa e adequada de políticas sociais.

2 – O que são políticas públicas e o que visam
“O meu ideal político é a democracia
Para que todo o homem seja respeitado como individuo
E nenhum seja venerado.”
Albert Einstein

Como disse na introdução, há muitos problemas de ordem estrutural que hoje afetam e de forma bastante significativa a sociedade em que vivemos, tanto no presente como no futuro próximo, mas o que de facto vêm a ser as políticas? E em particular para a população idosa?

Políticas sociais ou políticas públicas, são programas governamentais ou de organismos oficiais, que visam dar resposta especifica a problemas específicos da sociedade, dentro do âmbito de governo nacional, regional ou municipal.
As políticas públicas debruçam-se sobre os problemas prementes da sociedade, tentando colmatar as consequências nefastas da pobreza e exclusão social, criminalidade e delinquência, analfabetismo, saúde e epidemias, habitação, transportes, emprego e formação profissional e um vasto rol de aspectos socio-económicos e estruturais que na visão de Karl Marx baseavam-se quer nas “infra-estruturas” quer nas “supra-estruturas”  que estavam na base da organização social, económica e política da sociedade, modelo esse que é valido sociologicamente, e que se tem que ter em conta para planear essas políticas, que visam a normalização dos problemas estruturais, quer seja pela previsão, promoção, ou manutenção, como é o caso de políticas sociais para idosos como o PAII Programa de Apoio Integrado para os Idosos, dependentes, que visa responder às necessidades da população idosa em situação de dependência, dando assistência domiciliar, como o SADI Serviço de Apoio Domiciliário Integrado,  as UAI Unidades de Apoio Integrado, e abrangendo ainda o Plano Avô, que é um apoio à iniciativa privada social.
Os sistemas de segurança social, que estão neste momento em crise, foram durante muito tempo a resposta mais eficaz de apoio e de certa forma, evitaram políticas sociais mais pormenorizadas e de intervenções mais cirúrgicas como hoje, devido ao modelo que à época se praticava, embora construídos sob modelos diferenciados, os modelos de proteção social, visavam proteger os trabalhadores, as famílias e a velhice do conjunto dos seus cidadãos mais carenciados, segundo a lógica cristã (e também marxista) de cada um consoante as suas possibilidades para cada qual consoante as suas necessidades, através dos impostos que se recebia para serem distribuídos pela população consoante as necessidades,  hoje a população idosa é um dos maiores consumidores do sistema de proteção social, e é já uma fatia importante do mercado, havendo um crescente aumento de serviços de iniciativa privada voltados para a população idosa, desde saúde e cuidados domiciliários até a viagens de recreio e equipamentos adequados para o lar.[5]

3 – O Enquadramento do Programa de Saúde para Idosos
“Tememos a velhice,
À qual não temos a certeza
De poder chegar.”
Jean  de La Bruyère
Mas resta portanto definido que está o conceito de política social, analisar como é aplicada, e para tal abordo neste trabalho de uma política específica.
Numa conjuntura difícil, em que há claramente uma redução significativa do poder de compra, sobretudo das populações idosas, época da vida em que menos se ganha e em que mais despesas se tem, devido à fragilidade da saúde e ao défice de mobilidade, requer que os cuidados de saúde sejam um dos elementos chaves para atender a uma população idosa, permitindo que essa parcela crescente e cada vez maior, a que todos nós almejamos chegar, chegue à velhice e a viva com condições de saúde, autonomia, independência e satisfação, ou por outras palavras que viva uma velhice com qualidade.
Definir conceitos e elaborar projetos ou “desenhos” de programas de políticas públicas na área da população idosa é deveras fácil, mas é mister que se faça à luz do conhecimento científico, do que é verdadeiramente o envelhecimento antes de tudo, e fazê-lo claro com o apoio da gerontologia. Ciência multidisciplinar que nos pode auxiliar, visto ser esta ciência que estuda a velhice nos seus processos biológicos, psicológicos e sociais, e compreende-se hoje a velhice não como um problema, mas como um processo natural do ciclo da vida, como um processo de mudança genético-biológicos, sócio-culturais e psicossociais que se inicia mesmo antes do nascimento, ou seja além do envelhecimento físico a velhice é um constructo social não isento por vezes de uma gerontofobia.[6]
O Programa Nacional de Saúde Para as Pessoas Idosas, visa pois promover as condições de saúde à população idosa, um dos aspectos relevantes é de que em Portugal a maior causa de mortalidade na população com 65 anos ou mais (ver imagem IV), são as doenças do aparelho circulatório e os tumores malignos. Logo com esse dado  somado ao facto da possibilidade de os Acidentes Vasculares Cerebrais  aumentarem conforme a idade, torna-se um dado valioso na aplicação de uma política pública de saúde com vista a minorar esse problema. Embora o isolamento dos idosos no interior do Portugal profundo esteja abrangido por lei a este plano, a realidade é que a ajuda chega sempre mais tarde e por vezes de forma fatal no socorro desta população.
Claro está que somando aos aspectos científicos da gerontologia, aqui os dados da nossa geografia humana e até física de Portugal, com um litoral populoso e um interior deserto trazem repercussões no modo como se socorre os idosos, embora no interior tenham maiores possibilidades de ter alguma qualidade de vida.

4 – A Finalidade do Programa
“A coisa mais importante para toda a vida
é a escolha da profissão:
 quanto a isso, só o acaso dispõe.”
Blaise Pascal

O Plano Nacional de Saúde para Pessoas Idosas, foi um plano, que teve uma janela de tempo inicialmente prevista de 2004 até 2010, sob a alçada em termos normativos do Ministério da Saúde e da DGS Direção Geral da Saúde, plano esse que estava destinado a ser aplicado pelos profissionais da rede de centros de saúde, rede hospitalar e rede de cuidados continuados, complementados por orientações técnicas advindas da DGS sempre que assim se faça necessário,

Neste plano referido, do setor público da saúde, há no entanto a falha de não poder atingir todos os fatores relacionados com a saúde do idoso nos seus impactos no que toca à vida dos familiares, bem como aspectos referentes a ambientes urbanos, segurança pessoal, negligência, fatores ainda relacionados com abusos psicológicos, físicos ou sexuais, pelo que não implica que um mecanismo de integração com outros serviços pudesse ser alavancado no intuito de criar mecanismo de alerta e de apoio para prevenir tais situações, apoiando claramente as famílias que são os primeiros e os principais cuidadores.
Falta também, uma estratégia nacional concertada, no que toca às políticas públicas que promovam programas e ações de apoio à população idosa de forma integradora, dentro de uma orientação uniformizada a nível nacional, mas descentralizada pelos vários patamares quer regional quer do poder locar, indo até à freguesia e ao bairro ao encontro das populações idosas, com um projeto que seja claramente o de criar condições para um vida longa, e um envelhecimento ativo e bem sucedido, a velhice não pode ser culturalmente encarada como a antecâmara da morte, mas uma fase entre outras, que merece ser vivida com plenitude apesar dos défices que a idade impõe, incluída numa cultura intergeracional.
O PNSPI é criado dentro de um modelo consubstanciado na Rede de Cuidados Continuados de Saúde, que se propõe a criar sinergias entre diversas experiencias anteriores, que de políticas públicas nacionais ou locais, mas emanadas por organizações internacionais, como o Plano Internacional para o Envelhecimento de 2002, que gerou inclusive o PAII Plano de Apoio Integrado a Idosos, com o apoio técnico e o aval do Conselho Nacional para a Política da Terceira Idade e recebendo claramente a luz verde da Sociedade Portuguesa de Geriatria e Gerontologia (Seção da Sociedade de Ciências Médicas de Lisboa).
São observados no plano de forma inequívoca, os princípios das Nações Unidas, sobre os direitos da Pessoas Idosas, no que toca à sua independência, participação, auto-realização e dignidade.
Para além dos direitos acima o plano prevê que o idoso deve ser respeitado, no que toca ao reconhecimento dos idosos como um grupo heterogéneo que deve der respeitado e mantida a sua integridade e preservada a sua intimidade.
O PNSPI assenta em três pilares básicos:
1º - A promoção de um envelhecimento ativo ao longo de toda a vida;
2º - maior adequação dos cuidados de saúde às necessidades específicas das pessoas idosas;
3º - Promoção e desenvolvimento intersetorial de ambientes capacitadores da autonomia e independência das pessoas idosas.
Voltando para as pessoas idosas mais frágeis as prioridades de cuidados especiais frente à vulnerabilidade da idade avançada, pois as idades não sendo todas iguais, embora sendo todos idosos, tem vindo a fazer com que o conceito de “terceira idade” começasse a desaparecer do léxico terminológico dos vários profissionais, quer os de cuidados geriátricos, quer os de Gerontologia, bem como no uso habitual dos profissionais de saúde em particular, e a longo prazo da população em geral, pois não há uma terceira idade e sim uma população idosa, de idades diferentes, com características próprias e personalidade própria e inalienável que põe por terra o termo que pode ser tido como preconceituoso de “terceira idade”.
Tem portanto uma finalidade de atingir uma população com 65 anos e mais, pretendendo contribuir para o conceito de envelhecimento ativo, promovendo a longevidade com qualidade.
Para além dos cuidados de saúde, já referidos atrás neste trabalho, deve incluir-se a promoção de atividades físicas, desenvolvimento das funções cognitivas, gestão do sono e vigília, cuidados e noções de nutrição adequada à idade e a manutenção de uma velhice bem sucedida.
Com isso, e atingindo os objetivos pretende que os resultados sejam a de criar maior autonomia possível para o idoso no seu lar; recuperação da saúde oral, melhoria dos cuidados de saúde e a abordagem sobre os perigos da auto-mediação e polimedicação pela melhoria de acesso à informação  sobre saúde e medicação; Apoio psicológico a idosos com companheiros doentes de Alzheimer, Parkinson, ou outras doenças degenerativas.
O PNSPI é de suma importância no cuidado com a população idosa, mas também tem em si de forma implícita a consciencialização das demais populações de diversas faixas etárias e gerações, com o intuito de incutir que a velhice é uma fase da vida a que ninguém tem a certeza de chegar, mas que chegando deve ser vivida da melhor forma possível e com toda a dignidade que merece a pessoa humana, o mesmo é dizer, que somos todos nós ontem, hoje e amanhã.

5 – Bibliografia

CAPUCHA, Luís (2007) – “Envelhecimento e políticas sociais: Sociologia, 15, Pp. 337-348 Porto, Faculdade de Letras da UP.
FERNANDES, Ana Alexandra, Velhice, Solidariedades familiares e política social, Sociologia [online]. 2001, n.36 [citado  2012-06-12], pp. 39-52 .
MARTINS, Rosa M. L. e RODRIGUES, Maria L. M. (2004) Estereótipos sobre idosos, uma representação social gerontofóbica, pp 249-254  Viseu,  Instituto Superior Politécnico de Viseu.
MARUJO, Joaquim Parra, VER , Valores, Ética e Responsabilidade, O Futuro é grisalho, acedido em 11/06/2012 www.ver.pt/conteudos
Pordata, Base de Dados Portugal Contemporâneo,  Índice Sintético da Fecundidade, www.pordata.pt/esperanca-de-vida
Pordata, Base de Dados Portugal Contemporâneo,  Índice Sintético da Fecundidade, www.pordata.pt/Europa
[1] Pordata, Base de Dados Portugal Contemporâneo,  Índice Sintético da Fecundidade, www.pordata.pt
[2] Pordata, Base de Dados Portugal Contemporâneo,  Índice Sintético da Fecundidade, www.pordata.pt/indice
[3] MARUJO, Joaquim Parra, VER , Valores, Ética e Responsabilidade, O Futuro é grisalho, acedido em 11/06/2012 http://www.ver.pt/conteudos
[4] FERNANDES, Ana Alexandra, Velhice, Solidariedades familiares e política social, Sociologia [online]. 2001, n.36 [citado  2012-06-12], pp. 39-52 . Disponível em: www.scielo.gpeari.mctes.pt
[5] CAPUCHA, Luís (2007) – “Envelhecimento e políticas sociais: Sociologia, 15, Pp. 337-348 Porto, Faculdade de Letras da UP.
[6] MARTINS, Rosa M. L. e RODRIGUES, Maria L. M. (2004) Estereótipos sobre idosos, uma representação social gerontofóbica, pp 249-254  Viseu,  Instituto Superior Politécnico de Viseu.


Por Filipe de Freitas Leal

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Sobre o Autor

Filipe de Freitas Leal nasceu em Lisboa, em 1964, estudou Serviço Social pelo Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade de Lisboa. Estagiou como Técnico de Intervenção Social numa Instituição vocacionada à reinserção social de ex-reclusos e apoio a famílias em vulnerabilidade social, é blogger desde 2007, de cariz humanista, também dedica-se a outros blogs de temas diversos.

terça-feira, 17 de abril de 2012

O Status e seus dilemas na Visão de Everett Hughes

1 – Introdução e Resumo

"A História da Sociedade até aos nossos dias
é a História da Luta de Classes”
Karl Marx

O presente trabalho aborda de forma concisa, a visão sociológica, de Everett Carrington Hughes, sobre dilemas e contradições referentes à mobilidade social, e na luta pela ascensão social, que através da formação e qualificação, permitem a prática profissional e a conquista de um “status” almejado por muitos, mas conquistado por poucos, que é o que ilustra a frase de Karl Marx acima, ou seja a luta de classes.

Os dilemas referem-se sobretudo às diferenças e desigualdades surgidas no seio da sociedade em meio a essas lutas de poder e reconhecimento social, mas também da interação social no modo como os indivíduos de diferentes classes sociais, ocupações e profissões. se vêm e se relacionam entre si, baseados em princípios e valores culturais, costumes, tradições, mas também muito imbuídos de estereótipos e preconceitos quer sejam raciais, étnicos, religiosos ou de género.

Trata-se pois dos diversos modos de discriminação que estão ligados, direta ou indiretamente ao Status, uma delas é sem sombra de dúvida a discriminação de género, tendo em conta contudo que outros tipos de discriminação também influenciam o status social e a mobilidade social, podendo limitar o acesso ao mercado de trabalho por exemplo[1], tal como a que se refere à discriminação etária, em que uns são excessivamente novos para ingressar no mercado de trabalho, e outros excessivamente velhos para nele se manterem, trata-se de uma discriminação que é tabu mas existe[2], consequentemente vem gerar uma clara exclusão social das pessoas mais velhas, quando perdem o emprego, dos jovens que o não conseguem, ou ainda dos trabalhadores indiferenciados, que por não terem uma formação e qualificação profissional adequada, acabam por ter que aceitar contratos precários, enfim há uma série de discriminações, que são sobretudo visíveis através do mundo do trabalho, que geram aquilo a que Hughes vem chamar de dilemas e contradições do status social.

Everett Cherrington Hughes (1897-1983), sociólogo norte-americano, estudou de 1923 a 1928 no Departamento de Sociologia e Antropologia da Universidade de Chicago, tendo sido um aluno brilhante e foi mais conhecido como sociólogo da segunda geração da Escola de Chicago, estando voltado para as questões raciais, do trabalho e das profissões, tendo sido nesta última um dos pioneiros da Sociologia das Profissões, pelo que este seu artigo escrito no American Journal of Sociology aborda esse tema, que lhe era familiar, e fê-lo influenciado à luz da escola de Chicago e da corrente do Interacionismo simbólico.[3]

Neste artigo aqui analisado, escrito em 1945, por Hughes  para a revista “The American Journal of Sociology”, e intitulado de "Dilemmas and Contradictions of Status", em que referia que nunca antes e em nenhuma outra sociedade, tivesse havido tanta diversidade de status, como acontece nas sociedades ocidentais de hoje em dia,[4] em particular na sociedade americana do seu tempo, em que há uma grande heterogeneidade e movimentação social mas continuando a ter a ênfase nos indivíduos de raça branca, homens, protestantes, da classe média e de origem anglo-saxónica.[5]

Hughes afirma ainda que as posições sociais podem permitir a mobilidade, através da realização pessoal, quer pela  qualificação, quer pela formação, permitindo assim o acesso a um status  ao contrário do que antes fora por nascimento e origem.[6] No entanto o modo como se pode processar a mobilidade social de status, quer seja profissional ou de uma outra ocupação, bem como de género, raça, etnia e credo, que vem gerar sempre alguma confusão, e fazendo surgir contradições e dilemas nesse processo.

Corroborando esta ideia, afirma Hughes, que um indivíduo só será aceite como médico, mediante uma licenciatura, por exemplo, ou seja é condição sine qua non que para se obter o status de médico terá de se obter formação e qualificação de nível superior, que de outro modo não será válido e nem possível.

Mas Hughes afirma ainda, que na diferenciação ou acesso de status, estão também presentes os preconceitos de género e de raça que permitem ou impedem a mobilidade social, mesmo a pessoas que tenham obtido uma formação superior e qualificação adequada para serem médicos, sofrem ainda uma forma de exclusão por motivos raciais, deu o exemplo de um médico negro nos Estados Unidos, que ao socorrer um individuo branco e o acompanhar até o hospital, fora impedido de entrar, nem mesmo para dar explicações do socorro prestado e do estado do sinistrado, portanto claramente ainda que se tenha um diploma e uma profissão clássica respeitável, o racismo fora determinante na exclusão daquele médico negro.[7]

Hughes mostra a contradição deste preconceito, quando ilustra de modo cabal, que a maioria dos norte-americanos de qualquer categoria social aceitam sem reservas ser atendidos por um médico branco, protestante, com origens em famílias anglo-saxónicas da classe média, mas recusam um médico negro, ou de qualquer outra categoria, bem como o facto de um católico poder preferir ser atendido por um médico da sua fé, por motivos estritamente de conforto espiritual por exemplo.

Mas em se tratando de emergências, as pessoas normalmente aceitam ser tratadas por médicos de outras etnias e comunidades religiosas, ou então em caso de um médico que tenha adquirido fama e respeitabilidade.

Ilustrou ainda no seu artigo como exemplo, o facto de os homens serem os únicos a ter acesso à hierarquia eclesial da Igreja Católica Romana, com a flagrante contradição de que as mulheres são mais religiosas que os homens, e que para além de fazerem parte da maior fatia de fiéis da Igreja estão impedidas no entanto de ter acesso ao sacerdócio, também refere que nas grandes empresas e na indústria, os cargos são maioritariamente ocupados por homens, como sejam engenheiros, advogados, médicos, os gestores (sobretudo de topo) e supervisores serem maioritariamente do sexo masculino, o que é claramente uma exclusão social de género.[8]

 

2 – Análise do Artigo de Everett C. Hughes


"A coisa mais importante para toda a vida
é a escolha da profissão:
Blaise Pascal

Antes de tudo, gostaria de situar o artigo e também o autor, no que é o seu tempo e o seu espaço geográfico quando da edição do seu artigo, que nos mostram assim uma visão da sociedade e das circunstâncias, em que o artigo foi produzido, não negando de forma alguma a pertinência e a atualidade do mesmo; Falo de uma sociedade altamente influenciada pela II Guerra Mundial, do apogeu crescente dos Estados Unidos da América no Mundo e em particular na Europa, em franco desenvolvimento, tornando-se cada vez mais uma potencia económica (Plano Marshall) e uma potencia Politica e militar (onde imperou a Guerra Fria – confronto ideológico com o bloco socialista-soviético dominado pela U.R.S.S.), era também uma sociedade conservadora, onde os Estados Unidos, tinham uma política de segregação racial, tema por sinal estudado por Hughes em vários dos seus trabalhos, Hughes afirmava que os estudantes de sociologia e mesmo a maioria dos sociólogos do seu tempo eram marxistas, senão mesmo comunistas. antes da Segunda Guerra Mundial.

Antes de mais, a corrente que influenciou Everett C. Hughes, e da qual ele foi também um teórico, foi o estruturalismo simbólico da segunda geração da escola de Chicago.

As primeiras abordagens sociológica sobre as profissões e ocupações, foram fundamentalmente funcionalistas, no plano conceptual, em que entendiam a sociedade como um todo orgânico e equilibrado, em que os diversos elementos da mesma se integravam pela sua utilidade ou função. Por outro lado o interaccionismo simbólico, tem uma visão diferente do processo social, em particular no aspeto da estratificação social ligado às profissões e ocupações, vendo na interação dos indivíduos e dos grupos e da dinâmica daí surgida, tendo o estudo das profissões sido abordado por quatro períodos, o primeiro dos quais fez parte Everett C, Hughes, que foi um dos primeiros sociólogos a estudar as profissões e o status a elas ligado.[9]

No seu livro “Sociology” Anthony Giddens, fala-nos da mobilidade descendente, um fenómeno novo na mobilidade social, em que as pessoas envolvidas perdem o status herdado por não serem capazes emocionalmente ou mentalmente de o manter, muito associado a problemas de ordem psicológica, mas a mobilidade descendente pode ter também como causa afirma Giddens no desemprego, ou na mudança de emprego com um rendimento inferior, o autor afirma ainda que a mobilidade social está também presente na discriminação de género.[10]

Segundo Phillipe Riotort, foi Karl Marx quem inventou o termo classe social, mas que não podem dizer respeito apenas à sociedade industrial, são segundo o autor, grupos antagónicos que se opões uns aos outro pela posse dos meios de produção, que faz com que a pertença a uma dada classe social seja associada a um critério que é fundamentalmente objetivo, ou seja tem também um fim em si,[11] que passa pela detenção do capital, como fábricas, máquinas e também de títulos financeiros, estando a classe trabalhadora do outro lado da barricada vendendo a sua força de trabalho e criando o que é denominado por Marx como a MAIS-VALIA.

Marx via também um critério subjetivo nas classes sociais, tal como o faz o interacionismo simbólico do qual Hughes era mentor.[12], e esse critério subjetivo é o que se pode dizer de um sentimento de pertença a uma classe social e o que ela pode ou não representar.

Como Riutort afirmou, não podemos limitar o estudo da teoria das classes e estratificação e da mobilidade social apenas a Marx, Max Weber é também importante, pois diverge de Marx em aspetos importantes, não fala de classes reais, mas de classe que estão intimamente ligadas com o que chama de dimensões ou campos, como o económico, o estatutáro e o político, dá o exemplo de um líder sindical que pode ter uma posição elevada na esfera política mas uma posição baixa na esfera económica.

Riutort afirma em seu livro que “a estratificação é também abordada por Pierre Bordieu, que fala do espaço social e dos aspetos relacional, referentes à posição social e dos aspeto dinâmico referente à posição social e aos estilos de vida a ela ligados, sendo a estrutura desse espaço social baseada numa “estrutura do Capital” que são os mais variados recursos sociais como por exemplo o capital cultural, o capital social, e por conseguinte tem-se o volume de capital, que é a diferenciação de um profissional liberal e de um lavrador analfabeto que estão em campos opostos na distribuição desse capital”[13]

 

3 – A Estratificação e a mobilidade social


"A História da Sociedade até aos nossos dias
é a História da Luta de Classes”
Karl Marx

O tema abordado neste artigo, é de igual modo abordado por outros sociólogos, que convergem em grande parte com as questões de status, estratificação e mobilidade social, tais como os autores referidos por Phillipe Riutort, no seu livro “Primeiras Lições de Sociologia”, no qual refere as varias formas de estratificação e a mobilidade social, de diferentes culturas, tal como as castas no hinduísmo, ou de diferentes correntes ideológicas e sociológicas como a teoria de Karl Marx e a luta de classes nos seus escritos teóricos como “O Capital”, fala ainda de Max Weber e a teoria das dimensões económica, estatutária e política na questão da estratificação social, e não esquecendo claro Pierre Bordieu, e o espaço social com os aspetos dinâmico e relacional, ou do capital económico, capital cultural e capital social na construção da estrutura social.[14]

4 – Conclusão

"Ama a modesta profissão que aprendeste
E contenta-te com ela"
Marco Aurélio

Everett C. Hughes, com este artigo, permite-nos fazer uma ponte com toda a certeza, entre o modo como em sociedade se constrói a estratificação das classes sociais e da mobilidade social entre classes e o papel fundamental das profissões e das demais ocupações nesse processo social dinâmico, em que há contradições de dilemas.

Ilustrando as contradições criadas no processo social, posso referir o pensamento de Karl Marx, que interpretava em toda a sua obra o antagonismo da estrutura social estar baseada fundamentalmente no modelo capitalista, e isto é patente em toda a sua obra, quer seja na sua mais célebre obra “O Capital”, quer seja no prefácio à “Contribuição para a Critica da Economia Política” ou mais elucidativamente no “Manifesto do Partido Comunista”, no qual afirma “A História de todas as sociedades até aos nossos dias, é a história da luta de classes” (Manifesto Comunista, Obras pp 161-162)[15], O estrato social está relacionado mais aproximadamente à noção de estatuto, sendo que ao contrário do estatuto, a estratificação faz uma hierarquização social global.[16], sendo que segundo a pertença a uma classe social pressupõe um grau de fechamento, ou seja controlo de entrada e saída, seletividade, um sentimento de pertença partilhado pelos indivíduos da mesma classe ou grupo e uma mobilidade de curto ou amplo alcance.[17]


5 – Bibliografia


ARON, Raymond (2010), “As Etapas do Pensamento Sociológico; Pgs 152; Dom Quixote, Lisboa
ARAÚJO, Emilia e Outros (2011), “Introdução à Sociologia das Classes e da Estratificação Social; Pgs 12; Edições Ecopy, Ermesinde.
CARDIM, José.C e MIRANDA, Rosária R. (2007), “O Universo das Profissões”; Pgs 77-78; ISCSP/UTL,
GIDDENS, Anthony (2007), “Sociologia”, 5ª edição; Pgs 303-305; Fundação Gulbenkian, Lisboa.
RIOUTORT, Philippe (1996), “Primeiras Lições de Sociologia; Pgs 107-118; Gradiva, Lisboa.


[1] Hughes, Everett C. (1945) Dilemmas and contradictions of status – The American Journal of Sociology, Vol. 50 pp. 356
[2] Aguiar, Carla – Discriminação etária é tabu mas existe” DN Diário de Notícias, Lisboa 28/08/2006 consultado na internet, acesso 17/04/2012 Link: http://www.dn.pt/inicio/interior.aspx?content_id=645196
[3] Castro, Celso e Oliveira, M. Pombo (2005) Revista Teoria e Pesquisa N.º 46 – janeiro - Ciclos, pontos de inflexão e carreiras. De Everett C. Hughes.
[4] Há que ter em conta o contexto cultural, espacial e temporal, em que o artigo se insere (1945) e da dinâmica social, permite-nos observar que há uma evolução e mudanças continuas nos processos sociais.
[5] Hughes, Everett C. (1945) Dilemmas and contradictions of status – The American Journal of Sociology, Vol. 50 pp. 356
[6] Idem - pp. 353
[7] Idem - pp. 354
[8] Devemos no entanto ter em conta o ano da autoria deste artigo (1945) de lá para cá a situação tem vindo a se alterar gradativamente, mas continua a haver segregação do sexo feminino no acesso às carreiras de topo
[9] Cardim, J. C e Miranda, R. R (2007) “O Universo da Profissões” Pgs. 77-78 ISCSP, Lisboa
[10] GIDDENS, Anthony (2007), “Sociologia”, 5ª edição; Pgs 303-305; Fundação Gulbenkian, Lisboa.
[11] Rioutort, Philipe (1996) Primeiras Lições de Sociologia, Pgs 108 – Gradiva, Lisboa
[12] Idem. Pg 109.
[13] Idem, Pgs. 114-115
[14] Idem, Pgs 107-118
[15] Aron, Raymond (2010) As Etapas do Pensamento Sociológico, Pg, 152 – Dom Quixote, Lisboa
[16] ARAÚJO, Emilia e Outros (2011), “Introdução à Sociologia das Classes e da Estratificação Social; Pgs 12; Edições Ecopy, Ermesinde.
[17] Idem. 


Trabalho Académico de Sociologia das Profissões
Licenciatura em Serviço Social - 2ºAno - 2º Semestre (ISCSP/UTL)
Orientadora:
Professora Doutora Maria de Lurdes Fonseca
___________

Autor do blog Filipe de Freitas Leal

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Sobre o Autor

Filipe de Freitas Leal nasceu em Lisboa, em 1964, estudou Serviço Social pelo Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade de Lisboa. Estagiou como Técnico de Intervenção Social numa Instituição vocacionada à reinserção social de ex-reclusos e apoio a famílias em vulnerabilidade social, é blogger desde 2007, de cariz humanista, também dedica-se a outros blogs de temas diversos.

sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

Terceira Idade e a Violência Doméstica

Introdução

"Na juventude deve-se acumular o saber,
Na velhice fazer uso dele."
Piotr Kropotkin

Os maus tratos infligidos aos idosos, refletem uma assustadora realidade, que ano após ano, tem vindo a ser abordada com maior clareza e preocupação por parte das autoridades e população em geral, e é todavia no silêncio, que sofrem os maus tratos, muitas vezes impunes.

Há que frisar no entanto, que verdadeiramente não é um fenómeno novo[1], há deveras uma maior incidência percentual, e a somar-se a isso deve-se ter em conta o facto de o modo como se encara a violência doméstica e o que se passa dentro do lar é encarado hoje de forma radicalmente diferente e por vezes permissiva.

O presente trabalho aborda também o papel dos familiares, cuidadores, instituições de solidariedade social, assistentes sociais, gerontólogos, enfermeiros, e a sociedade em geral de uma forma pertinente, até porque os dados que tem vindo a público, informam o aumento da violência contra as pessoas idosas.

O Jornal de Notícias, na sua edição de 7 de outubro de 2010, noticiava: "Maus tratos a idosos mais que duplicaram", continuando o jornal dizendo que "de 2000 a 2009 os crimes contra idosos teriam tido uma subida de 120% (...) todos os dias, dois idosos em média, são vitimas de maus tratos de algum tipo, desde violência fisica, emocional, passando pelos abusos financeiros", informação referida no jornal nortenho seguindo os dados fornecidos pela Associação de Proteção e Apoio à Vitima (APAV).

O crescimento da violência e maus tratos contra pessoas idosas, é acompanhado simultaneamente com alterações profundas nas sociedades pós moderna, com uma visão altamente competitiva e consumista, que veio influenciar, em muito, a definição do rumo e paradigmas que culminaram nas mudanças estruturais ora vigentes, tanto do ponto de vista político, sócio económico, como cultural e por fim refletindo-se nas mudanças tecnológicas, que vieram imprimir à sociedade pós-moderna um cunho vincadamente excludente de tudo o que não seja voltado para a cultura hedonista, baseada no efémero, na rapidez, na eficiência, no lucro, na moda, no novo e no belo, em que os idosos não são tidos em conta, esquecendo-se que a Terceira idade ativa e bem sucedita, numa relação de intergeracionalidade tem e terá muito ainda a contribuir para a sociedade, com a sua sabedoria e experiencia de vida.


Uma das grandes mudanças sócio económicas, que se sentiu a partir dos anos 60 do Século XX foi sem sombra de dúvida, o crescimento do Demográfico da População Idosa, e sobretudo, estando acompanhado por uma queda na natalidade, fez aumentar o peso dos idosos na soma da população total, somam-se ainda as melhorias das condições de vida, no aspeto económico e o referido jornal e a APAV, alertaram que a violência contra idosos ocorre em certos casos de maneira subtil, sendo desapercebida ou inclusive aceite e tolerada na sociedade, pelo que se deve combater contundentemente e promover a integração intergeracional, a justiça e a solidariedade.



1 – Resumo


“A Idade não é decisiva;”
O que é decisivo é a inflexibilidade,
Em ver as realidades da vida
E corresponder a elas interiormente”

Max Weber

Este trabalho, realizado no âmbito da Cadeira de Introdução à Gerontologia, aborda o tema da Violência e da Negligência Parental na Terceira Idade, entendendo-se por violência todo e qualquer maltrato, quer de cariz físico, psicológico e moral, bem como a negligência às necessidades da pessoa idosa desde cuidados de saúde, alimentação, passando pelo controlo e abuso financeiros, isolamento intencional do idoso e também por fim o abandono.

Abordamos aqui de uma forma sucinta, sem no entanto descurar dos pontos chaves de que trata a gerontologia, e nesse sentido iremos necessariamente abordar a conexão e convergência de ação entre a gerontologia e a praxis do Serviço Social, tendo em conta a necessidade de definição de conceitos essenciais para compreender, estudar e desenvolver ideias no combate ao fenómeno dos maus tratos em pessoas idosas.

No estudo de caso, descrevemos ainda a história verídica e problemática de uma ocorrência de violência doméstica e maus tratos continuados, cometidos contra uma pessoa idosa, (…)[2] no seio familiar, o que aliás é na maioria dos casos onde ocorre este fenómeno.

Falamos ainda através da falência progressiva do sistema de cuidados informais baseados em laços familiares, amizade, vizinhança, como eram os bairros antigos e como ainda se vê em alguns locais de Portugal, que faz nascer a necessidade de promover uma assistências adequada mas cada vez menos, tendo a família alargada deixado de lado com as alterações sociais ao longos do século XX, passando a ser uma família nuclear em média de dois filhos, mas já comumente de filho único, ou de famílias monoparentais, em que só o existe o progenitor e o filho, trazendo consequências a longo prazo pelo envelhecimento da população no topo e na base, também há cada vez mais pessoas a viverem sozinhas e estamos aqui a falar de todas as faixas etárias.

Roger Fontaine afirma no seu livro: “Psicologia do Envelhecimento” “a manutenção da participação social, é condição de uma velhice bem sucedida” e acrescenta que há uma “reforma-reivindicação – o reformado conterta o estatuto de velho na sociedade (...) os idosos deveriam unir-se e constituir um grupo de pressão”.[3]

Palavras Chave: Maus Tratos, Solidão, Abandono, Negligência parental


2– Introdução

"Cada fracasso ensina ao homem
algo que necessitava aprender"
Charles Dickhens

O presente trabalho, vem abordar o tema da violência e os maus tratos infligidos contra pessoas idosas, e retrata no Estudo de Caso a ocorrência de violência doméstica, sofrida por uma senhora idosa, e que fora perpetrada por um familiar, trata-se de um caso verídico em que os nomes dos intervenientes em causa, são alterados com o intuito de mantermos o respeito pela identidade e privacidade dos mesmos, mas que achamos necessário para de uma forma clara compreender-se a dimensão das consequências do fenómeno, trata-se pois de um caso em que a vitima suportava em silêncio os maus tratos sofridos, tendo no entanto tomado a decisão de se defender, quando a violência tomou proporções insuportáveis e atingia já outros membros da família, o que nos leva a crer que agindo assim por medo e pressões psicológicas as vitimas são muitas mais do que alguma vez as estatísticas e os relatórios das autoridade possa ter.

Com o objetivo de melhor compreender o fenómeno da violência, ou mesmo simplesmente da vivência dos idosos, da sua situação de saúde, solidão entre outros aspetos, foi realizado um conjunto de entrevistas que serão apresentadas em power point.

Definimos o conceito de Maus Tratos, seja de caratér físico, psiquico, abuso sexual, abuso financeiro ou seja ainda por negligência parental, de modo a abordar com clareza as dimensões que afetam a vida da população idosa enquanto vítima, e da sociedade enquanto portadora deste mal, fazendo com que tenhamos de compreender o fenómeno na sua origem, para elaborar e promover a proteção das vítimas, levando à justiça os criminosos e realizando dentro de um espírito de humanismo a praxis do Serviço Social.

Este tema da Violência contra as Pessoas Idosas, foi amplamente debatido no 3ème Congrès de l’AIFRIS – Association Internationale pour la Formation, la Recherche et l’Intervention Social,[4] que se realizou em Hammamet, Tunísia de 21 a 24 de abril de 2009, e no qual também se abordou a natureza do vinculo inevitável e fundamental entre a Gerontologia e o Serviço Social de modo multidisciplinar, onde afirma “A acividade dos assistentes sociais, direcionada para as populações em situação de fragilidade social, é suportada pela estrutura sócio cognitiva e pela forma identitária que alimenta o seu saber agir (...) estabelece uma dialética permanente entre a ação e o esforço de compreender e conhecer esse saber e agir” apoiado claramente pela gerontologia no intuito do serviço social se fazer presente no socorro aos idosos e a todas as populações alvo.

Tal como qualquer outra dimensão humana, a Velhice é um construto social, e é na diferença cultural, de época para época e de lugar para lugar que a definição do que é o idoso ou o envelhecimento, que se categoriza e encara a Terceira Idade de formas diferentes.

Urge criar condições de dignificação e integração das pessoas idosas na sociedade, de modo intergeracional positivo e criativo. A sociedade é de todos e para todos.


3 – Definição de Maltrato e Violência Doméstica


“É uma infelicidade que existam tão poucos intervalos
Entre o tempo em que somos demasiadamente novos
E o tempo em que somos demasiadamente velhos”
Montesquieu

Por maus tratos podemos definir, toda a situação intencional, que cause danos quer reversíveis ou não ao idoso (bem como qualquer vitima de violência ou maltrato) e podem ser praticados de diversas formas, que abaixo indicamos.

No entanto a definição não é universal e suscita várias controvérsias por entendimentos diferentes, no entanto é ponto pacifico que é um fenómeno com reconhecimento como problema social, mas não diferem muito do que acima foi citado e do que abaixo assinalamos.

A maioria dos casos é praticado por familiares dentro das paredes do lar, mas há casos que é praticado por estranhos, estando os idosos a cuidado de terceiros em instituições como lares etc.

- Maus Tratos Físicos
- Maus Tratos Psicológicos
- Negligência Parental
- Abuso Sexual
- Abuso Financeiro

A vulnerabilidade e mais ainda a forma como é encarada e entendida a velhice e o envelhecimento como construtos sociais, repercutem a existência da violência e dos maus tratos em determinados casos.[5], Isabel Dias, diz ainda que associado ao envelhecimento encontra-se o fenómeno dos maus tratos., pois o estatuto da velhice  não é conquistado pelo idoso, não é no entanto igual o fenómeno e em Portugal não há dados suficientes para fazer-se um levantamento da realidade da violência doméstica contra o idoso, dos maus tratos, do abandono e abusos de diversa ordem, pelo que o fenómeno é diferente de país para país, por exemplo na Austrália, Canadá, Inglaterra e Irlanda do Norte, o fenómeno da violência contra idosos oscila entre 3% a 10%, por exemplo no Canada 55% dos casos denunciados eram de abandono, 15% de maus tratos físicos e de 12% de abusos financeiro.[6]

4 – Estudo de Caso
“Honra teu pai e tua mãe,
a fim de que tenhas vida longa na terra,”
Êxodo 20.12

Processo familiar (Estatuto de vítima Art.14 da lei nº 112 2009 de 16 de Setembro) Dados do atendimento.

O pedido da própria foi efectuado um atendimento social no qual a D. Miquelina (nome fictício), expôs a sua situação actual. A D. Miquelina e seu filho Pedro, portador de síndrome de DOWN estão a viver numa casa cedida pela sua irmã, escondidos, por ter sido alvo de ameaças de morte por parte do seu ex-companheiro. Foi vítima de maus tratos físicos e psicológicos por parte deste companheiro que continuava a aborda-la bem como ao seu filho. Este indivíduo, segundo relatos da própria tem problemas de alcoolismo. Apresentou queixa dia 11 de Novembro de 2011 e foi acompanhada para a APAV (Gabinete de Apoio a Vitima de Cascais) onde se encontra em acompanhamento desde essa altura. Dado o contexto da violência, a senhora, foi aconselhada pela equipa da APAV a abandonar a casa onde residia para um local desconhecido pelo agressor. Foi pedida pela mesma a ajuda dos bombeiros para o transporte dela e do filho derivado aos problemas financeiros que atravessa e também como uma medida de segurança pelo que foi bem recebida pelos bombeiros de cascais.

O projecto de vida desta senhora passa pela fuga definitiva para os Açores, onde reside a sua filha mais velha. Com o acompanhamento da família residente na ilha pensa conseguir organizar a sua vida. Esta filha é também tutora do Pedro. Refere que a família já procurou casa para os dois e assegurou uma habitação dando um sinal, onde podem entrar a partir de Fevereiro de 2012. A casa onde se encontram actualmente esta penhorada ao banco e por isso a qualquer momento tem que abandonar, a D. Miquelina vem solicitar ajuda para a compra dos bilhetes de ida para os Açores, para acabar com este sofrimento que tem passado pelo que a idade já não ajuda (69 anos) e ficando perto da filha sempre pode contar com alguma ajuda e ajudar também a filha porque não gosta de estar dependente e quer sentir se segura para seguir a sua vida.

A D. Miquelina afirma que durante estes longos 20 anos de sofrimento, só tinha aguentado a violência pois esta não afetava o seu filho e “(…) desde à 2 anos que tem piorado tanto para mim como para o meu filho, por isso já não aguentei e tive que largar um homem que bebia ate cair para o lado e que me chegava a bater com o cinto e um cabo de electricidade que tinha. As marcas ainda hoje permanecem no meu corpo e no do meu filho, acho que nenhuma mulher e criança merecem os horrores que eu vivi. Cheguei a estar com uma faca fincada no meu pescoço (…)”

5 – Os Maus Tratos em Idosos - Estatísticas

"O segredo de uma velhice agradável
consiste apenas na assinatura de
um honroso pacto com a solidão"
Gabriel Garcia Marquez

O fenómeno da violência doméstica contra idosos, não é novo, mas tem se agravado, com o aumento do envelhecimento demográfico que no topo quer na base, gerando problemas e desafios necessários para promover a inserção dos idosos, penalizar o crime e combater o isolamento social a que muitos estão votados, para tal  urge fortalecer as redes sociais de relacionamento de proximidade e de familiares.

Na Europa dos 27, em 2008, houve um crescimento de 17% da população com mais de 65 anos de idade, e uma taxa de dependência dos idosos com cerca de 25%, sendo para o nosso país percentagem era respetivamente de 16% e 26%.[7]

As forças de segurança registaram, só no primeiro semestre de 2009, 14.600 queixas de violência doméstica. Isto equivale a uma média de 81 participações por dia; E significa que cerca de 1 (mais concretamente 1,4) em cada mil habitantes de Portugal apresentou uma queixa deste tipo;

Em comparação ao primeiro semestre de 2008, houve um aumento de 12% de denúncias; A grande maioria dos denunciantes de situações de violência doméstica são as próprias vitimas.

O Perfil do Agressor

O agressor é maioritariamente do género masculino e na casa dos 40 a 50 anos, sendo  parente próximo da vitima de violência doméstica no idoso, morando na maioria das vezes entre paredes, onde a pressão psicológica é exercida com maior poder. (ver Anexo I)


6 – Conclusão
“Devemos aprender durante toda a vida,
sem imaginar que a sabedoria vem com a velhice”
Platão

A realidade crua da situação de Violência Doméstica na Terceira Idade, e dos diversos modos como ela é praticada, onde é praticada e por quem é praticada, colocam ao Serviço Social e à Gerontologia, uma missão de grande envergadura, pois o Serviço social parte dos problemas do individuo ou dos grupos vulneráveis e em sutuação de grande carência material ou psíquica, visando compreender a situação e encontrar uma resposta capaz.

Deve-se ultrapassar barreiras culturais, para criar uma mudança, para abrir espaço onde os jovens, os adultos e os idosos sejam em pé de igualdade elemento insubstituíveis e ativos.

O Serviço Social é multidisciplinar constituindo-se de várias dimensões com as quais desenvolve a sua Práxis, a saber:

1 - Normativa – porque regula e é reguladora
2 - Estratégica – porque tem objetivos, métodos e meios de acordo com modelos estabelecidos.
3 - Teleológica – Porque tem fins determinados por valores, numa visão humanista e humanizadora e uma visão humanista também do mundo social.
4 - Dramatúrgica – porque é no campo profissional que sendo seu corpo e instrumento vive o drama da pessoa humana nos mais variados contextos e complexidades.

Trabalho Académico de Introdução à Gerontologia
Professora Doutora Paula Campos Pinto - Curso de Serviço Social
Andreia Nicolau
Filipe Leal
Joana Soares
José Luís Rodrigues
Sara Vieira
 Lisboa, 2012


7 – Autores Citados e Bibliografia
Bibliografia

Eidelwein, Karen (2007) “Psicologia Social e Serviço Social: uma relação interdisciplinar na direção da produção de conhecimento” - Revista Textos & Contextos Porto Alegre v. 6 n. 2 p. 298-313.  jul./dez. 2007
Iamamoto, Marilda V. (2006) O serviço social na contemporaneidade: trabalho e formação profissional. 10. ed. São Paulo: Cortez,
Maia, A; Guimarães, C; Carvalho, C; Capitão, L; Carvalho, S; Capela, S (2007) CONGRESSO FAMÍLIA, SAÚDE E DOENÇA, 2, Braga, Portugal, 2007 – “Congresso Família, Saúde e Doença: atas”. [Braga: Universidade do Minho, 2007]. Repositório Universidade do Minho
McGee, Robin A, David A. Wolfe, Sandra A. Yuen, Susan K. Wilson, Jean Carnochan, (1991) “The measurement of maltreatment: A comparison of approaches” - The University of Western Ontario, London, Ontario, Canada, Repositório Elsevier
Núncio, Mª José (2010) “Introdução ao Serviço Social - História, Teoria e Métodos” - Lisboa, ISCSP.
Monteiro, Sílvia Raquel T. (2010) Maltrato por Omissão de Conduta, A Negligência Parental na Infância – Estudo de Caso – Dissertação de Mestrado em Medicina Legal – Universidade do Porto – Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar, Porto

Infografia
SAÚDE E VIOLÊNCIA – Ao longo do Ciclo de Vida” Dinâmicas Relacionais Associadas" (Grupo de Trabalho Sobre Violência ao Longo do Ciclo de Vida, Roda do Poder Controlo; Saúde e violência Consultado em 05/12/2011.

[1] Alves, Cláudia (2005) “Violência Doméstica” pp 18  , Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra.
[2] Pires, Sónia (2009) “Violência Sobre Idoso” Câmara Municipal da Amadora – Gabinete de Ação Social, Amadora. Portugal
[3] Fontaine, Roger (2009) Psicologia do Envelhecimento, pp 156. – Climepsi Editores, Lisboa.
[4] Pereira, Fernando (2009) Serviço Social e Gerontologia – Articulações e Fronteiras,  Instituto Polítécnico de Bragança – Faculdade de Psicologia, Bragança.
[5] Dias, Isabel (2004) Violência na família – uma abordagem sociológica, pp. 141, Ed. Afrontamento, Lisboa
[6] Idem.
[7] Pereira, Fernando (2009) Serviço Social e Gerontologia – Articulações e Fronteiras,  Instituto Polítécnico de Bragança – Faculdade de Psicologia, Bragança.

Autor Filipe de Freitas Leal

Sobre o Autor

Filipe de Freitas Leal nasceu em Lisboa, em 1964, estudou Serviço Social pelo Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade de Lisboa. Estagiou como Técnico de Intervenção Social numa Instituição vocacionada à reinserção social de ex-reclusos e apoio a famílias em vulnerabilidade social, é blogger desde 2007, de cariz humanista, também dedica-se a outros blogs de temas diversos.

 
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