Acho interessantíssimo, o sentimento que me atinge e
muito me apraz, ao ler a opinião de ilustres portugueses, cujas ideias em muito
se parecem com o que pelos meus devaneios já passou, e nas quais vejo as mesmas
afirmações diante dos mesmos problemas; Coincidência? Talvez não.
Na verdade, muitos de nós poderemos ter pensado o mesmo,
ao divagarmos, sobre problemas do quotidiano que nos afetam, a critica comum,
mas por vezes surda, de tudo o que está mal na nossa sociedade.
Quando li Eça de Queiroz, apaixonei-me pela sua escrita,
pelo seu modo perspicaz, e por vezes também satírico e sarcástico, no modo como
descrevia a sociedade portuguesa do seu tempo.
Foi ainda na juventude que ao ler Eça, reconheci que as
suas criticas, presentes na sua obra, que como por exemplo em “A Cidade e
as Serras”, sobre as divisões políticas de Portugal que permaneceram no
pós Guerra Civil do fim do Séc. XIX, e em que opôs os Liberais fiéis a D. Pedro
IV e os absolutistas da situação do usurpador D. Miguel, formando assim um país
politicamente dividido entre Miguelistas e Liberais, retrato em tudo igual ao
que hoje se vê na no quotidiano português, entre sociais-democratas e
socialistas; Mas é sobretudo em “Os Maias” romance que nos
prende incansavelmente até que o livro se esgote em nossas mãos que podemos
obter a presença perene de uma mentalidade que persiste ainda no sub-consciente
coletivo português, ou ainda em “A Relíquia”, uma comédia onde o sarcasmo e o
bom humor são a marca que nos deixa, em forma de critica à religiosidade da
época.
No entanto sente-se que muito embora a história avance
inexoravelmente, ainda que os regimes mudam, as revoluções que foram feitas, ou
sobretudo a técnica que avança imparável e sempre a favor de um progresso cujo
destinatário é mais o capitalista que o cidadão comum, ainda que o País se
tornasse uma República laica, e que tanto o fascismo Salazarista como o
colonialismo tenham sucumbido, permanece ainda hoje na cultura portuguesa, as
marcas profundas, da sociedade desse tempo, cuja influência ao longo dos anos
se faz presente.
E é o que veio dizer precisamente o realizador português João Botelho (65 anos, nascido em Lamego), 'Os
Maias' continuam a mostrar a imagem de um Portugal sem sentido … e sem remédio”
afirmações feitas na ante-estreia da sua adaptação do romance de Eça de Queiroz
para o cinema 'Os Maias Cenas
da Vida Romântica', tendo afirmado precisamente o que hoje os
portugueses sentem, descontentes que estão dos seus governantes, num sentimento
de 'beco sem saída', num pais sem objetivos e sem futuro. (1).
Resta-nos saber até quando? Vale a pena vermos o filme
que estreia a 11 de setembro nos cinemas, vale a pena lermos o livro e
aperceber-nos do quão semelhante é hoje Portugal em mentalidade e espírito ao
Fim do Séc. XIX.
Fontes e Referências:
(1): nota do autor.
Autor Filipe de Freitas Leal
Sobre o Autor
Filipe de Freitas Leal nasceu em Lisboa, em 1964, estudou Serviço Social pelo Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade de Lisboa. Estagiou como Técnico de Intervenção Social numa Instituição vocacionada à reinserção social de ex-reclusos e apoio a famílias em vulnerabilidade social, é blogger desde 2007, de cariz humanista, também dedica-se a outros blogs de temas diversos.