Introdução
“Todas as casas onde há livros,
Quadros e discos são bonitas.
E são feias todas as casas,
Por mais luxuosas,
Onde faltem essas coisas”
Eugénio de Andrade
A
atual situação económica na Europa, e particularmente a situação portuguesa,
tendo vindo a agravar-se, vem mostrar, as graves consequências para o país,
para as empresas, e sobretudo para as famílias, que ao verem desabar-se-lhes o
chão, perdem o seu sustento, poderão perder por acréscimo, tudo quanto tem, e
por vezes tudo o que necessitam, e tudo que têm de mais valioso, o lar da
família, o emprego, chegando a perder por vezes a saúde, há casos de pessoas
que levam para o resto da vida, as consequências das dividas e de uma
insolvência daí advinda, levando, a alegria de viver, e não raras
vezes a própria família se divide, perdendo o passado e o futuro.[1]
1 – Como se explica o
fenómeno dos desalojados?
"Cada fracasso ensina ao homem
algo que necessitava aprender"
Charles Dickhens
Como nos mostra a visão, no artigo especial “Os novos desalojados”
a principal causa deste surto de despejos, ou execuções judiciais,
deve-se à crise que tem vindo a agravar-se desde o verão de 2008, com a Crise
do Subprime, desencadeada nos Estados Unidos da América em 2006 tendo o seu
auge no verão de 2008, alastrando-se desde então pelo mundo inteiro, e
particularmente na Europa, que abalada, viu ser colocada em cheque a
convergência económica e a consolidação da moeda única, o Euro. A crise, que na
altura nasceu financeira, passou também a ter rapidamente, os contornos de
uma crise económica, onde a Islândia entrara em banca rota, não tendo afetado o
euro por não ser membro da EU União Europeia, já a queda da economia da
Irlanda, e o resgate que o país pediu, pôs a nu a fragilidade da moeda única, e
da economia europeia, que na realidades encontra-se a duas velocidades, surge o
termo PIG’s, para designar de certa forma pejorativamente os países em crise
(Portugal, Irlanda, Grécia e Espanha), que na economia mundial contrastavam com
os BRIC’s Brasil, Rússia, Índia e China, países em larga ascendência económica,
a ascensão destes países, teve claramente consequências na economia europeia, a
partir de deslocalização de empresas fabris, nomeadamente os acordos do OMC
Organização Mundial do Comércio que afectou os têxteis portugueses, não sendo
competitivos em temos de custo com os da Índia ou do Bangladesh.
Gustavo Cardoso, escreveu no Público, afirmando que tal como na ciência o Zero
Absoluto, não é na realidade possível de ser alcançado, na economia, certas
medidas de ajuste e reajuste, não surtem e não surtirão os objetivos meramente
teóricos, ou seja, para Gustavo Cardoso, não basta pagar a divida, e nem ter
mera política de contenção, é precisamente o contrário que defende, é preciso
criar politicas de promoção do emprego e do crescimento económico, tal como nos
Estados Unidos da América, e as política tomadas para se poder sair da crise de
29.[2]
Resumindo,
a grave situação social, que se encontra à vista do cidadão comum, dos
despejos, das falências de empresas e insolvências de famílias, tem também na
sua origem um modelo económico, que não promoveu a estruturação real e concreta
da economia, antes produziu castelos com baralhos de cartas, que agora se
desmoronam, optou-se pelas auto-estradas, pelas construtoras, e deixou-se de
lado a industria, as pescas, a agricultura ou até mesmo o turismo, e na
habitação o tripé das construtoras que construiriam, das imobiliárias que
vendiam, dos banco que emprestavam, foi essa a resposta que o setor privado
deu, às necessidades dos cidadãos, face à ausência de políticas públicas de
habitação mais definidas e arrojadas.
Esse modelo não é só nosso, a Espanha trilhou o mesmo caminho, e hoje
aproximadamente 500 mil famílias estão sem casa, vidas e lares destruídos
devido a um modelo económico errado, que buscou a eficácia e a eficiência sem ter
um rosto humano, sem ter as pessoas no centro das suas opções políticas,
administrativas e económicas, que esta a acarretar um aumento exponencial de
suicídios em Espanha e também em Portugal, onde já se morre mais por suicídio
que por acidentes de automóvel.
2 – Que fatores essenciais estão por detrás deste “novo” fenómeno social?
"Quem motiva uma boa ação,
É tão meritório como aquele que a praticou”
Talmude
Os fatores fundamentais, se voltarmos na história, a não
muito anos atrás, teremos a compreensão que se trata de paradigmas, que foram
intensificados com a queda do muro de Berlim, e o fim do braço de ferro, entre
a corrente socialista soviética e a área capitalista liderada pelos Estados
Unidos da América e pelas potencias europeias, como o Reino Unido, França,
Itália e a então, Alemanha Ocidental, que até então tinham políticas sociais
baseadas no Wellfaresate, pode-se dizer que o Projeto europeu, preconizava a
convergência económica entre os diversos povos da Europa, mesmo à altura do
socialista francês Jacques Delores, que defencia uma politica social que era em
muito, baseada no modelo próximo do Wellfare Sate, que começou a alterar-se com
o moderado democrata-cristão luxemburguês Jacques Santer, que foi aliás a
partir dessa altura que a hegemonia socialista declinou dentro da União
Europeia, devido precisamente ao fim da Cortina de Ferro, e ao inicio de uma
expansão económica a Leste, há aqui uma forte componente ideológica, que
aproveitou o facto de o Comunismo e do Socialismo terem falhado para promover,
baseado no paradigma Neo-Liberal as politicas económicas e financeiras, com
vista à criação de um Banco Central e de uma moeda Única forte para toda a
Europa. É aqui que reside parte do problema, ou seja os Bancos Centrais de cada
país da zona Euro, perderam a capacidade e a soberania, para indicar quais as
políticas a seguir, que promovam o emprego e o crescimento económico, sendo que
o BCE também não os substituiu nesse sentido, e limita-se a fiscalizar as
contas das finanças dos países membros da moeda única, e a controlar a despesa
pública, pelo que é inibido o investimento estatal que possa promover o
crescimento, tal como ocorreu no New Deal, que só assim pôs termo à crise de
1929, como prova disso temos já o adiamento do Novo Aeroporto de Lisboa, do TGV
e outras grande obras públicas, que poderiam ser o mote de relançamento da
nossa economia.
3 – Que tipo de alterações ou necessidades pode suscitar uma súbita
modificação das condições de acesso à habitação?
"A grandeza de uma profissão é talvez
Antes de tudo, unir os homens:
Não há senão um verdadeiro luxo,
e esse é o das relações humanas"
Antoine de Saint-Exupery
Como resposta, podemos olhar para trás e ver o que se verificou nos Estados
Unidos da América, em que várias famílias, ao perderem as suas casas,
literalmente ocuparam praças públicas, com tendas, e viveram nessas tendas,
obviamente em condições sub-humanas, tinha-se instalado uma crise social da
habitação, ou podemos olhar agora para Espanha e ver o que já se passa por lá,
com o aumento exponencial de suicídios.
Por
cá, a agência de notícias lusa, informava em 2011, que o aumento de “Pessoas
Sem Abrigo” teve desde 2008, um aumento de 20% a 30%, a partir de contagem
feita pela AMI Assistência Médica Internacional, com a colaboração de equipas
de rua
Há
já, neste momento, um agravamento das necessidades habitacionais, e uma
readaptação do mercado, no que toca à baixa do valor dos imóveis, devido à
crise financeira e económica, acompanhado também de uma baixa no valor do
arrendamento, não obstante, a baixa de preços da habitação, não resolve todos
os problemas, muitos casais jovens (e não tão jovens) em situação de desemprego
de um dos cônjuges ou de ambos, tiveram que devolver as casas ao banco e optar
por morar com parentes, outros optaram por imigrar.
A
SEDES Associação para o Desenvolvimento Económico e Social, no seu estudo O
Impacto da Crise no Bem Estar dos Portugueses, afirma que dos inquiridos no seu
estudo em Setembro de 2012, onde indica que 56% afirmavam poder vir a não
honrar os seus compromissos nos próximos 12 meses, que é um sinal alarmante,
tendo em conta que a estagnação, embora com oscilação de valores percentuais,
tem vindo a ocorre no nosso país desde 2002, ou seja mesmo antes da crise do
subprime, e a esperada recuperação não veio, e agravou-se, afetandos todos os
setores da sociedade e trazendo problemas acrescidos em todas as áreas, se Portugal
importa cada vez menos, devido à queda da procura, também as exportações
diminuem, pois a falência das empresas diminui a oferta de produtos e a
capacidade de exportar, somando à queda da procura dos nossos produtos no
mercado externo gerando mais falências e despedimentos, ou seja todos os
setores são afetados e a habitação é uma deles, tornando-se hoje um problema
social, cuja continuidade da crise poderá agravar ainda mais o desemprego e
através disso o incumprimento no pagamento da habitação, por parte das famílias
e a consequente insolvência de pessoas singulares.
4 – Que soluções (Públicas, Privadas, Cooperativa ou Solidárias) são
apresentadas ou podem ser apresentadas para enfrentar este problema social?
"Ama a modesta profissão que
aprendeste
E contenta-te com ela"
Marco Aurélio
No mesmo estudo da SEDES, (acima citado) aponta que 45% dos portugueses estão
resignados com a situação e acham que não vale a pena fazer mais nada, no
entanto a persistência dos problemas, e sobretudo o agravamento dos mesmo,
implica que se façam tomar medidas, e cuja solução poderá passar, na minha
opinião pessoal, pelo apoio e incentivo ao associativismo e à incrementação das
cooperativas, não apenas de cooperativas de habitação, também na cooperativas
agrícolas, e cooperativas de distribuição, criando um mercado mais humano e
economicamente sustentável, e fundamentalmente na habitação, esse
associativismo e cooperativismo permitiria fazer crescer a produção,
recuperação de imóveis e até de zonas habitacionais degradadas, recorrendo
inclusive a novos materiais alternativos de construção, e a poder criar uma
arquitetura urbana de rosto humanista, promovendo uma sustentabilidade
económica e ambiental das pessoas com a comunidade e o meio envolvente,
suprindo a sociedade de infra estruturas comunitárias, de cariz cooperativo
desde a educação à saúde, passando pela cultura e o lazer, fundamentada numa
nova economia local e desse modo se criaria mais empregos, permitindo uma
oferta a baixos custos da habitação, mas também de bens e serviços.
5 – Deverão as famílias esperar mais do governo e das suas políticas de
habitação?
"Não é a consciência que precede ao
ser social,
Mas é o ser social real que precede à
consciencia"
Karl Marx
A tendência atual dos governos Néo-liberais na Europa, é de menos intervenção e
mais regulação, ora isto mostra-nos o que se poderá vislumbrar, por parte do
Estado, no momento de nos perguntarmos sobre o que deverão esperar os cidadãos,
e sobretudo podemos prever quais as opções que o governo tomará.
Observa-se
que os gastos do Estado com a habitação social, têm vindo a reduzir, já desde
2006 e sobretudo acentuam-se com a crise do Subprime de 2008, é de esperar pois
uma diminuição dos gastos com a habitação, o que propiciará talvez, a tendência
de habitação clandestina com consequência da crise, mas que não é uma novidade
em Portugal, pois cerca de 40% das habitações na década de 70 eram ilegais, e
sem falar de barracas dos bairros de lata.
Não
têm sido tomado em conta, as necessidades de alojamento e a real clientela das
políticas públicas, e essa é uma das questões centrais da Política de
Habitação, segundo Isabel Guerra do ISCTE/IUL no seu estudo de 2011 intitulado
“Cidades, Comunidades e Territórios, o que nos leva a crer que há que haver uma
alternativa ao centralismo no que toca à habitação em Portugal, e não tem que
passar necessariamente pelo poder local, mas sim ser efetuado em parceria tanto
com o poder local como com a iniciativa quer do associativismo quer do
cooperativismo.
6 –
Afinal o que é ou como se manifesta a preocupação social da habitação?
"Meu ideal político é a democracia,
Para que todo o homem,
Seja respeitado como individuo,
E nenhum venerado "
Albert Einstein
O
presente trabalho, vem abordar o tema da habitação, no contexto de Políticas
Públicas, e obviamente trata-se de uma preocupação social, isso traduz-se em
algumas politicas quer diretas quer indiretas que o governo promove, para
solucionar as necessidades de alojamento, em particular de populações
carenciadas, essa preocupação social pode traduzir-se quer em apoio ao
arrendamento jovem, ou em situação de pessoas ou famílias em dificuldades, o
apoio ao aluguer com ajuda monetárias por parte das câmaras municipais no que é
chamado Habitação a Custos Controlados, e é feito na base de um banco de casas
para arrendar, pode passar também pela construção e reconstrução de imóveis,
bem como de programas de urbanização que tentam criar uma nova dinâmica social
a um determinado bairro e com o objetivo de promover também a inclusão social.
Dos
programas públicos para a promoção da habitação e do alojamento, temos a
PROHABITA, que pode também financiar a reconstrução da habitação, temos ainda o
PER Programa Especial de Realojamento, que permite aos municípios a erradicação
das barracas dos bairros de lata e o realojamento dessas populações.
Trabalho Académico de Políticas da Habitação
Licenciatura em Serviço Social
Orientador: Professor Doutor Albino Cunha
Autor: Filipe Leal (210.425)
Lisboa, abril de 2013
8
–Bibliografia
Guerra, Isabel (2011)
“Cidades, Comunidades, Territórios” – ISCTE/IUL – Lisboa, pág. 42
Sapo-Notícias (2011)
“Número de sem-abrigo aumentou 20% a 30% desde 2008” Site consultado
14/04/2013.
SEDES, (2012)
“O Impacto da Crise no Bem Estar dos Portugueses”
Público (2013) “O
Zero Absoluto” Página consultada dia 14 de Abril de 2013.
Abril (2013) “
Espanha: Suicídios de pessoas que perdem as casas” Página consultada dia 14/04/
2013.
Autor Filipe de Freitas Leal
Sobre o Autor
Filipe de Freitas Leal nasceu em Lisboa, em 1964, estudou Serviço Social pelo Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade de Lisboa. Estagiou como Técnico de Intervenção Social numa Instituição vocacionada à reinserção social de ex-reclusos e apoio a famílias em vulnerabilidade social, é blogger desde 2007, de cariz humanista, também dedica-se a outros blogs de temas diversos.